“Dentro, fora do Brasil” - Estudante da NOVA FCSH dá voz à diáspora brasileira em contexto eleitoral
25 de Junho de 2025, 10:43

“Este filme emerge como um ato de resistência e memória decolonial, que expõe feridas abertas e registra um tempo que corre o risco de se repetir.” Quem o afirma é Marina Schneider, estudante do Mestrado em Ciências da Comunicação da NOVA FCSH e realizadora do documentário “Dentro, fora do Brasil”, recentemente indicado ao Grande Prêmio Nacional do FEST – New Directors | New Films Festival, que se destaca por ser um dos festivais de cinema mais relevantes do país para jovens realizadores, tendo lugar de 21 a 29 de junho, em Espinho, Portugal. O projeto registra o conflito histórico entre imigrantes brasileiros que foram às urnas para votar no segundo turno das eleições presidenciais brasileiras, expondo as divergências e tensões políticas entre a esquerda de Lula e a extrema-direita de Bolsonaro, mesmo fora do país.
Realizado em 2022 no âmbito da disciplina Ateliê de Televisão, ministrada pelo professor Luís Gouveia, o primeiro corte do filme foi apresentado nos encontros Segunda Segunda Lisboa e Levante Cultural Produções, após retorno positivo dos colegas de turma. Já a versão final do filme foi concluída em 2024, ano em que integrou a programação da Mostra Nacional de Jovens Criadores do Gerador, em Santa Maria da Feira. Em 2025, o documentário foi selecionado para a competição Estudantes, na categoria Documentário, no Porto Femme – International Film Festival.
Com uma abordagem documental de proximidade, a realizadora observa, escuta e regista o ambiente no exterior das seções de voto. A câmara acompanha eleitores brasileiros em solo português enquanto partilham opiniões, dúvidas, esperanças e ressentimentos sobre dois projetos de país antagónicos: o representado por Luiz Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro.
A obra parte de uma questão essencial: é possível estar fora de um lugar e, ao mesmo tempo, profundamente imerso nele? O que conduz a narrativa do filme e articula-se com o próprio percurso migratório da realizadora, que viveu sete anos em Portugal, primeiro no interior, depois em Lisboa, acompanhando o crescimento exponencial da comunidade brasileira no país — atualmente com cerca de 400 mil pessoas, representando 40% da população estrangeira residente.
À conversa com a NOVA FCSH, Marina Schneider reflete: “Para muitos de nós, a política portuguesa parecia distante, quase invisível, enquanto a brasileira permanecia presente, urgente e emocionalmente incontornável. As eleições tornaram-se um espaço de confronto, mas também de pertença.”
A realidade encontrada em Lisboa pela estudante foi de grandes emoções e nervosismo “Através da câmera, eleitores compartilharam suas angústias, fervores, paixões e receios enquanto aguardavam a apuração das urnas. Nossa pequena equipa, formada por duas mulheres jovens e munida de equipamentos mínimos, foi frequentemente confundida com uma equipe de transmissão ao vivo de algum grande canal de televisão. O filme se encerra com o retrato coletivo do dia da eleição: uma explosão de celebração, seguida por um silêncio desconcertante — ninguém sabia o que o futuro reservava.”
Stills do documentário “Dentro, fora do Brasil”
Este regresso ao projeto, necessário segundo Marina Schneider, “surge diante dos acontecimentos rápidos, brutais e imprevisíveis que se seguiram. Dias após o anúncio do resultado, o país assistiu, estarrecido, a um ataque violento à democracia: apoiadores do ex-presidente de extrema-direita invadiram e destruíram o Congresso Nacional, num ato terrorista. Em 2023, o Tribunal Superior Eleitoral declarou Bolsonaro inelegível por abuso de poder e uso indevido dos meios de comunicação. Já em 2024, a Polícia Federal revelou um plano assustador: um atentado contra Lula, expondo a participação de Bolsonaro na tentativa de golpe.”
Ao revisitar o arquivo dois anos depois da filmagem, a realizadora compreende que o tempo não retirou a relevância da obra — pelo contrário, intensificou-a. O que era retrato passou a ser também denúncia e memória. Para concluir, a estudante cita Marina cita Eduardo Galeano “A história é um profeta com o olhar voltado para trás: pelo que foi e contra o que foi, anuncia o que será.”.
“Dentro, fora do Brasil” será exibido no dia 27 de junho, às 16h, no Auditorium. Saiba como assistir através do website oficial do festival. O trailer do Documentário pode ser assistido aqui.
Sobre a realizadora
Marina Schneider é uma cineasta e guionista luso-brasileira, especializada em narrativas que investigam género, sexualidade e território. É Licenciada em Cinema com especialização em Escrita Cinematográfica pela Universidade da Beira Interior (Covilhã, Portugal) e mestre em Ciências da Comunicação com especialização em Cinema e TV pela Universidade NOVA de Lisboa (Lisboa, Portugal). Autora de “EGUNCIO”, longa-metragem em desenvolvimento produzido pela Aurora Cinema (PE, Brasil), premiado no Festival de Roteiro de Língua Portuguesa GUIÕES (2021) e no Laboratório Nuevas Miradas EICTV – Cuba (2024). O projeto também foi finalista no FRAPA – Festival de Roteiro Audiovisual de Porto Alegre (2022) e selecionado para o Brasil CineMundi (2024). Também assina a criação de “Seis Incensos”, minissérie que aborda imigração brasileira e exílio queer. Desenvolvida como projeto de conclusão de mestrado, sob orientação do professor Paulo Filipe Monteiro, a obra encontra-se em fase de desenvolvimento com a produtora BRO Cinema (Portugal). Estreou-se como realizadora com o curta-metragem “Raiano” (2023) e, em seguida, com o documentário “Dentro, fora do Brasil” (2024), atualmente em circulação por festivais e nomeado ao National Grand Prix do FEST – New Directors | New Films Festival (Portugal). Atuou ainda como professora de roteiro na Casa do Brasil de Lisboa, no programa sociocultural Casa Cria – Dinâmicas para Artistas Migrantes.