Doação Gabriel Pereira Bastos

A biblioteca de Gabriel Pereira Bastos contém cerca de 2900 obras de várias temáticas, sobretudo Psicologia e Antropologia, com maior incidência no estudo das comunidades ciganas.

José Gabriel Pereira Bastos nasceu a 9 de janeiro de 1943 e faleceu a 19 de março de 2021.

Licenciado em Psicologia e em Ciências Antropológicas, Doutorado em Antropologia Social e Cultural, Psicanalista detentor de uma longa experiência terapêutica, foi uma das pessoas que melhor refletiu e escreveu sobre o pensamento de Freud. Tomou o legado freudiano como um ponto de partida para formular uma teorização antropológica global do ser humano: uma abordagem integrativa que contemplasse as dinâmicas pulsionais, fantasmáticas, simbólicas e dramáticas que percorrem as produções socioculturais, económicas e políticas. O seu percurso científico foi norteado pelo combate ao estilhaçamento disciplinar, questionando fronteiras artificiais entre saberes reforçadas por um paradigma racionalista-positivista, que constituía a seu ver um desejo de não saber, de rasura da complexidade infinitamente perturbadora do humano.

O primeiro ensaio deste vasto programa epistemológico foi a sua teoria estrutural-dinâmica de análise do texto literário, perspetivado como uma rede orientada de relações tensionais e de construções fantasmáticas, no âmbito da disciplina de Psicanálise e Literatura que lecionou na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. O segundo passo foi a sua transição para o departamento de Antropologia da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, onde articulou a psicanálise com os saberes antropológicos, reorientando as suas aquisições teóricas para o estudo dos processos identitários.

O seu foco continuou a ser a ação humana, perspetivada em termos epistemológicos e políticos. As identidades não podiam ser abordadas sob um prisma unilateral, mas como uma multiplicidade estratificada e estratégica de representações, vocacionadas para a valorização e expansão da autoestima identitária de sujeitos e grupos; ou, numa vertente conflitual, para o eventual esmagamento identitário de outros concebidos como rivais. Esta abordagem forneceu a fundamentação teórica para as múltiplas pesquisas desenvolvidas por uma equipa interdisciplinar que, em colaboração com Susana Trovão, dirigiu no Centro de Estudos de Migrações e Minorias Étnicas da NOVA FCSH. No âmbito do CEMME, encetou ainda a sua atividade científica e cívica, de investigação e de denúncia das condições de vida das comunidades ciganas em Portugal, uma atividade que o tornou a voz mais autorizada em Portugal no tocante ao conhecimento dos ciganos portugueses.

Nos seus últimos anos, dedicou-se ao trabalho, infelizmente inacabado, de redescobrir e de divulgar a vida e a obra de uma mulher fundamental do nosso século XX: Maria Lamas, sua avó.