"Há algo muito bonito em trazer beleza ao que está em bruto": Conversa com Magna Araújo Amorim
1 de Outubro de 2024, 13:26
Magna Araújo Amorim, fotógrafa e estudante da licenciatura em Ciências da Comunicação, venceu o programa Youth4Regions desenvolvido pela União Europeia e dirigido a aspirantes a jornalistas. A aluna obteve um reconhecimento na categoria de Fotojornalismo com trabalhos fotográficos que representam a construção da nova linha rosa do metropolitano do Porto. As fotografias destacam-se particularmente pela sua capacidade de eludir a uma relação do metro com a cidade, numa articulação que toma o ponto de vista do desenvolvimento de novos elementos deste transporte público.
As fotografias de Magna Araújo Amorim estão agora a concorrer ao Prémio Megalizzi – Niedzielski também na categoria de fotojornalismo. O galardão, que também é atribuído pela Comissão Europeia, abre as suas votações a partir de 1 de outubro e todos/as podem votar neste link.
Com o intuito de conhecer as motivações e os conceitos trabalhados por Magna, a NOVA FCSH esteve à conversa com a estudante de Ciências da Comunicação.
Vimos que tens realizado trabalhos na área da moda. Tendo isso em mente, de onde diria que surgiu o teu interesse em participar no projeto do Youth4Regions?
O meu interesse em participar no Youth for Regions veio de um e-mail da professora Marisa, a coordenadora do Departamento de Ciências da Comunicação, em que ela partilhou que vários alunos da NOVA FSH já tinham participado e alguns tinham vencido. A partir daí pensei “estou na área, porque não tentar adquirir novas ligações, contactos, e se ganhar vai-se a Bruxelas conhecer novas pessoas, fazer networking, porque não?”.
Portanto, a participação no projeto tem muito a ver com ter recebido esse e-mail, portanto, muito obrigada à professora Marisa.
O projeto com o qual venceste o Youth4Regions representa uma relação entre o metropolitano e o a cidade moderna. De que forma é que esta relação provinda da sociedade inspirou o teu trabalho? E que outros aspetos da sociedade gostarias de retratar e capturar?
Eu gosto muito de causas sociais e de fugir um bocado da normalidade. Por exemplo, quem pensa neste projeto pensa logo em sustentabilidade, mas eu não pensei propriamente em sustentabilidade. Eu pensei na forma como os transportes públicos melhoram uma cidade ou na forma como a existência de um metro liga a cidade. Por exemplo para além da linha rosa, que foi o que eu fotografei, no mesmo dia tinham aberto a linha amarela então de que forma é que novas linhas e um novo metro e novos transportes públicos podem ajudar uma cidade a ligar-se cada vez mais.
Foi isso que eu tentei retratar, o behind the scenes do que liga uma cidade. Portanto eu gosto muito desse tipo de questões sociais, do que é que move uma cidade, o que é que muda uma cidade, como é que uma cidade avança, não avança, quais são as mudanças numa capital como Lisboa? Então é isso que eu tento procurar nos meus projetos, relacionar as causa sociais com a arte. A questão é como é que eu posso aliar uma causa social ou algo importante com a arte ao invés de fazer apenas um projeto bonito, mas que não tenha muito fundamento.
O que é que te surpreendeu mais nesse primeiro contacto com o projeto do metropolitano?
A dimensão. Foi extraordinário estar no sítio onde eles fazem as estações e olhar para cima. Estamos a falar de um túnel com 23 metros, que eu tive de subir. Portanto, ter a noção do quão distante e do quão grande um metro é e como aquilo movimenta milhares de pessoas, milhões de pessoas durante o ano, não foi propriamente chocante mas foi impressionante.
Fotografias vencedoras do Youth4Regions e candidatas ao prémio Megalizzi – Niedzielski
Podes falar-nos sobre alguns dos teus outros projetos que tens realizado em fotografia?
Eu trabalho com um estúdio criativo chamado Adversa e nós desenvolvemos vários projetos em várias áreas. Na área da moda, por exemplo, nós colaborámos com o Moda Lisboa na Semana da Moda de Lisboa… aí fizemos um projeto de fotografia conceptual, ou seja, um registo um pouco diferente do que é a moda – não são as modelos paradas, bonitas. Tentámos criar movimento com as fotografias sem fazê-lo através do vídeo, ou seja, procurámos usar o still e criar movimento através disso. Foi a partir daí que fizemos já algumas colaborações com designers.
Também colaboramos com o Neopop, um festival de música eletrónica em Viana do Castelo com a mesma ideia de tentar transparecer o movimento e a energia dos artistas enquanto estão a atuar sem usar o vídeo. Eu gosto muito de fotografia e vídeo então eu tento juntar os dois, aliar os dois. E as minhas fotografias são muito de pessoas a mexerem-se e pessoas a fazerem coisas, movimentos.
Também fizemos uma residência artística nos estúdios Victor Cordon onde explorámos a mesma ideia de um registo mais conceptual sobre o bailado, ou seja, a partir de como se pode mostrar bailarinos sem perder um minuto a ver o bailarino a fazer um determinado movimento, ao invés de perder um minuto a gravar e depois retirar uma fotografia que representa todo um movimento de braços ou de pernas ou a dançar.
E os meus registos passam muito por isso, ou por algo na linha do trabalho do metropolitano em que aliamos uma causa social a um registo mais artístico. Ou se calhar num registo mais artístico, mas sempre com o fora do comum à mistura. Não é só sobre um bailarino só a dançar é o nós estarmos a ver o bailarino a dançar. Eu gosto desses registos mais bizarros, podemos chamar-lhes assim.
Tens alguma forma de arte específica gostes mais de fotografar?
Eu adoro dança, porque eu fiz dança durante muito tempo. Eu era bailarina, fui bailarina durante 10 anos. Portanto mim ter a capacidade de perceber o que está a acontecer e conseguir aliar isso à fotografia é fantástico para mim. Mas também gosto muito de obras e de museus e de coisas a acontecerem e coisas a serem construídas, a serem feitas. Gosto muito disso também, desse lado mais bruto. Há algo muito bonito em trazer beleza ao que está em bruto.
Após teres vencido este prémio na categoria de fotojornalismo, gostarias de continuar a explorar e trabalhar na área?
Completamente. Aliás, eu já estou a trabalhar na área. A formação na NOVA FCSH é mais um complemento ao que eu já estou a fazer. Eu já trabalhava na área, eu já tirava fotografias. Eu agora estou simplesmente à procura de mais portfólio, mais clientes e mais pessoas e como é que eu posso pegar na minha visão artística e torná-la em algo maior.
Portanto, poder ter ideias mais conceptuais, se calhar fugir daqueles projetos que são só “ok, isto é bonito, vamos fotografar, fazer uma coisa mais elaborada”, é continuar agora a crescer e dinamizar ainda mais.
Como vês o desenvolvimento do fotojornalismo com a predominância do audiovisual e do conteúdo rápido nos meios de comunicação social?
Não acho que o jornalismo ou o fotojornalismo se estejam a perder. De todo. Aliás nós cada vez mais temos acesso a notícias digitais. Estamos a deixar os jornais mas vemos o Expresso online e abrimos os comentários do Expresso e nunca tanto se viu uma discussão sobre os temas atuais. E eu não acho que o fotojornalismo se esteja a perder porque se calhar nós estamos é a desvalorizar as notícias e o jornalismo como um todo.
O fotojornalismo continua a ser importante. A National Geographic continua a valorizar as pessoas que vão fotografar guerras e conflitos e pessoas a passar fome. Isso continua a ser valorizado, aliás são, diria eu, das fotografias mais valorizadas.
Eu acho é que é o jornalismo que se está a perder, portanto, começamos a ver uma desvalorização ao jornalista, quer porque cada vez mais vemos o jornalista assumir uma posição, que é algo que nós aprendemos isso no curso, quando não estamos a fazer jornalismo na opinião não é a posição a seguir. Mas também vemos cada vez mais pessoas a desvalorizarem a transmissão de informação. Se nos reportam que algo está a acontecer porque x aconteceu vem alguém dizer que “a minha opinião não é essa, por isso a informação está errada”. Então nós estamos a ver uma desvalorização cada vez maior do que é transmitir uma notícia, uma informação, um facto. Por isso cada vez mais vermos coisas como o polígrafo, ou fake news e desinformação e esta pessoa modificou para isto se adequar à minha ideologia, à minha perceção Eu quero acreditar nisto, portanto vou à procura dos factos que corroborem a minha ideologia e acabamos por ver uma desvalorização da que é a transmissão de informação verdadeira.
Então eu não acho que seja o fotojornalismo que se está a perder, é mais o jornalismo que começa a entrar em decadência. O fotojornalismo continua a ser relevante.
E porque é achas que o fotojornalismo continua a ser relevante?
Porque as pessoas adoram ver esse tipo de fotografias. Pessoas em sofrimento, pessoas em guerra, coisas chocantes.
É uma realidade que não é a nossa e então tudo o que mostre uma visão quase artística, bonita de coisas más, é algo que as pessoas gostam de ver. Por isso é que as pessoas adoram ver filmes de guerra, por isso é que as pessoas adoram ver aquelas reportagens e aqueles documentários de true crime. É embelezar o que é chocante e feio. E as pessoas adoram esse tipo de coisas. Por isso é que o fotojornalismo em países de África por exemplo viraliza nas redes sociais, porque “estas pessoas estão a passar tão mal mas é tão bonita esta fotografia, demonstra tão bem as dificuldades”. E as pessoas adoram ver isso.
Gostarias de participar num projeto semelhante no futuro ou achas que gostarias de permanecer mais pela moda e pela arte?
Eu gostaria de participar em projetos que me permitam crescer. Seja se isso passa pelo fotojornalismo ou pela moda ou se passa por fotografia de cena num filme. Se houver alguma forma em que eu possa pegar na minha visão artística e colocá-la nalgum projeto, seja ele de que área for, eu acho que isso pode ser interessante para mim. Não me prender a uma coisa.
Porque depois somos conhecidos por aquela coisa e só fazemos aquela coisa, não fazemos mais nada e como é que crescemos a partir daí. Então eu procuro não me adaptar à visão artística dos outros, mas criar eu a minha própria visão artística e colocá-la noutras áreas.