NOVA FCSH inaugura exposição de livros censurados

“Esta leitura não educa nem constrói” foi a avaliação da censura à obra O Professor, de Charlotte Brӧnte, em 3 de julho de 1943. Para o regime censório, o romance tinha “passagens de certo modo inconvenientes para a disciplina social” e afetava “a boa moral que devemos a todo o custo valorizar”, como se pode ler no relatório dos Serviços de Censura. Se este livro acabou por ser autorizado pelo diretor deste Serviço, o mesmo não foi consentido a centenas de outros durante os 48 anos que durou o Estado Novo.

Para assinalar os 50 anos do 25 de Abril, a Divisão de Bibliotecas e Documentação e a Infraestrutura ROSSIO da NOVA FCSH dinamizam uma exposição sobre os livros proibidos pela censura durante o Estado Novo. As obras adquiridas e preservadas por Mário Sottomayor Cardia, Luiza Neto Jorge, Vitorino Magalhães Godinho ou José Rodrigues Miguéis, que estão à guarda da NOVA FCSH e podem ser consultadas nas Bibliotecas NOVA FCSH, constituem uma prova da resistência ao Estado Novo e reúnem-se agora numa exposição. Esta divide-se entre o átrio da Biblioteca Vitorino Magalhães Godinho, no campus de Campolide, o átrio da Torre B, no campus da Av. de Berna e, também, o Portal ROSSIO.

Num percurso que se inicia em 1926, ano em que a censura é implementada, esta exposição demonstra como o regime censório aos livros desde cedo se constituiu como um mecanismo de consolidação do regime, sua ideologia e princípios, e um instrumento para restringir, condicionar e reprimir o que contra ele se produzisse.

A vigilância e controlo de influências políticas opostas ao regime, como o comunismo, foi um dos critérios constantes da censura, que proibiu desde logo todos os livros de Karl Marx ou dezenas de obras de Lenine. Os seus livros continuaram, contudo, a entrar em Portugal, como o demonstram Travail salarié et capital: salaires, prix et profits e La maladie infantile du communisme: (le gauchisme) da sua autoria, respetivamente, presentes na exposição no campus de Campolide e pertencentes ao espólio de Vitorino Magalhães Godinho.

A influência política e ideológica presente na literatura foi também uma preocupação constante da censura, que não só proibiu obras como as Novas Cartas Portuguesas e levou à abertura de um processo judicial contra as suas autoras, como também recorreu à destruição de mil e cem exemplares da edição de 1946 de Vagão J, obra de Vergílio Ferreira. Este ato da censura, contudo, não impediu a preservação dessa mesma edição, da qual um exemplar pode ser visto no campus da Av. de Berna.

A moral e os costumes do Estado Novo, naturalmente, não podiam ser afetados por literatura “sem graça nenhuma”, como foram consideradas as piadas de Bocage, ou por livros que convidavam “as inteligências femininas a libertarem-se de todos os preconceitos, crenças e ideias absurdas na conquista dos direitos iguais aos do homem”, como o fazia a obra A mulher, de Soledad Gustavo. Estes comentários podem ser lidos pela letra dos próprios censores nos relatórios exibidos na exposição virtual disponível no Portal ROSSIO.

Nos campi da NOVA FCSH a exposição física estará patente até dia 30 de maio, e a exposição virtual pode ser visitada em permanência no Portal ROSSIO. Evidencia-se assim a intenção e ação da censura aos livros durante o regime, bem como a fuga aos seus mecanismos de restrição e coação através da riqueza do espólio das Bibliotecas NOVA FCSH e da potencialidade da Infraestrutura ROSSIO para a investigação e divulgação cultural. A Divisão de Bibliotecas e Documentação associa-se assim à comemoração dos 50 anos do 25 de abril, realçando a importância do seu legado para o país, que assinalou o fim do carimbo vermelho que marcou a proibição de tantas obras.

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