Pestes

A peste, como doença infeciosa, afetou vários continentes desde a Antiguidade. A peste negra ou peste bubónica de 1348 foi aquela que melhor perdurou no imaginário coletivo europeu. Portugal, tal como em outros países, continuou a registar surtos pestíferos quase até ao século XX. Alguns receberam nomes que espelhavam a intensidade da doença, como a “peste grande” (1569), ou a “peste pequena” (1598). Em épocas mais recuadas, a palavra peste podia aplicar-se a outras doenças. Atualmente, sabe-se que a doença é provocada pela bactéria Yersinia pestis e que pode assumir três formas principais: peste bubónica, peste septicémica e peste pneumónica. As duas primeiras são transmitidas pela picada da pulga ou pelo contato com animais infetados; e a terceira, por via respiratória.

A eclosão de surtos pestíferos nas cidades medievais podia acontecer por vários motivos, incluindo o contágio proveniente de lugares infetados. Em 1491, D. João II informou o concelho de Lisboa de que a peste grassava em Sintra e em Lagos, ordenando que fossem tomadas medidas para evitar a difusão da doença.

CML/AML – “D. João II informa o concelho de Lisboa sobre a existência de focos de peste” (1491).

Cota: PT/AMLSB/CMLSBAH/PS/003/01/0007

Embora o poder concelhio procurasse prevenir a difusão da peste, nem sempre atuava da melhor forma. No século XV, o infante D. Duarte repreendeu o concelho de Lisboa por ter deixado aportar um navio inglês, cuja tripulação apresentava vários casos de peste.

CML/AML – “O infante D. Duarte critica o concelho de Lisboa por ter sido responsável por um surto de peste” [1421-1433].

Cota: PT/AMLSB/CMLSBAH/CHR/005/025/0332

Em contextos de peste, as populações em pânico procuravam encontrar responsáveis pelo contágio. Assim aconteceu em Lisboa em 1506, quando os cristãos novos foram acusados de propagar a doença e, por isso, massacrados, tendo o ataque começado no Convento de São Domingos, no Rossio.

CML/AML –“Rossio antes do terramoto de 1755, em primeiro plano, o chafariz de Neptuno” (1940).

Cota: PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/EDP/002063

Os doentes apresentavam febre, fraqueza e dor de cabeça, a que se podiam juntar outros sintomas consoante a variante da doença. Esta não distinguia entre mulheres, homens, jovens, idosos, ricos ou pobres. No Mosteiro de Lorvão, por exemplo, a peste negra matou, em 1348, a maioria das monjas.

DGPC/SIPA – “Mosteiro de Lorvão” (1992).

Cota de registo: IPA.00001598

Cota da fotografia: SIPAFOTO.00103541

Os concelhos medievais queixavam-se aos monarcas dos problemas causados pelas pestes,  tais como o aumento da mortalidade e o consequente despovoamento. Em 1372, Silves afirmava que a cidade era “mais despovoada que nenhum outro lugar do Algarve”, devido, em parte, à “pestelença grande”.

DGLAB/ANTT – “Capítulo de Cortes de Silves” (1372), Chancelaria de D. Fernando I, Livro I, fól. 117v.

Cota: PT/TT/CHR/F/001/0001

As cidades preocupavam-se em ter ao seu serviço físicos, ou seja, médicos, mas também podiam chamar outros peritos quando viviam circunstâncias mais graves. Em 1606, Lisboa foi apoiada pelo cirurgião do rei, Marcos Alberto, como atesta o documento onde se declara o montante que lhe foi pago.

CML/AML – “Marcos Alberto atesta ter recebido 450.000 reis” (1606).

Cota: PT/AMLSB/CMLSBAH/CHC/026/0001/0040

Até à descoberta da cura, a fuga para locais seguros era a prática mais corrente. Em 1510, em Guimarães, a Colegiada de Santa Maria da Oliveira determinou nos seus estatutos que, em caso de epidemia, os clérigos deviam abandonar a localidade.

DGLAB/ANTT – “Estatuto do Cabido de Guimarães no Tempo da Peste” (1510).

Cota: PT/TT/CSMOG/DE6/07

Quando afligidas pela peste, as populações pediam auxílio aos santos consagrados como protetores contra tais flagelos. Em 1506, D. Manuel pediu a Veneza uma relíquia de S. Roque para reforçar a proteção de Lisboa contra a peste.

FCG/BA – “Igreja de São Roque, Lisboa [Material Gráfico]” [1962-1964].

Cota: CFT008.557

Quando o pior já tinha passado, as populações agradeciam a intervenção e o apoio divino no combate à doença. Em 1570, depois da peste grande, Lisboa passou a celebrar anualmente uma procissão para agradecer o auxílio de São Sebastião e de Nossa Senhora da Saúde, que se mantém até aos dias de hoje.

CML/AML – “Procissão de Nossa Senhora da Saúde saindo da Sé de Lisboa” (1909).

Cota: PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/FRA/I00050

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